domingo, 29 de abril de 2012

Tecnologias

      Após muito tempo de vida, já realizando suas atividades com lentidão, bastante defasado em relação aos mais jovens e visivelmente danificado - sendo até motivo de chacota entre os familiares -, chega finalmente o fim... do meu celular! Extremamente alheio às novidades tecnológicas destes aparelhos, preferindo sempre o que fosse eficiente - em simplesmente ouvir e falar -, e que não precisasse realizar cálculo matemático para entender o menu, passei esta semana chateado. Precisando escolher outro celular, convidei uma pessoa altamente especializada em tecnologia - minha esposa - para me socorrer nesta empreitada, e me deparei com uma infinidade de opções nas vitrines, com explicações das atendentes que mais pareciam aulas de Física I e que me fizeram sentir como um membro das tribos isoladas da Amazônia. Após um bombardeio de informações técnicas das autoridades femininas, comprei (ou  fizeram-me comprar?) um tal de Android que, pelo muito que ouvir e pouco que entendi o robô só faltava falar, ou melhor, falar é o que de mais simples ele sabia fazer.
      Depois, lendo o manual para diminuir a minha ignorância, descobri que Android é o sistema operacional do equipamento, que realiza rapidamente uma infinidade de funções com os vários ships que possui - tira foto e filma com recursos bem variados, faz contatos através de mensagens, emails, viber, tem gps, navegador, músicas, calculadora, calendário, documentos do Office, gravador de voz, rádio, wi-fi, ponto de acesso portátil, bluetooth... Tem até  bloqueio de palavras ofensivas e emoticons, segundo o manual é "para dar vida às mensagens". Pensei até em usá-lo para assar pão, já que também utiliza microondas, igual ao forno (perto deste, o menu do meu falecido parece mais o de um restaurante de beira de estrada).
      Acostumado com o comportamento primitivo de apertar as teclas para me comunicar, deslizar o dedo sobre a tela do celular foi uma tarefa divertida e engraçada - para a plateia familiar a que me assistia. Novamente precisei da ajuda de um outro professor, meu filho de 15 anos, que, com muito carinho e bom humor, foi pacientemente me explicando a utilidade dos intermináveis aplicativos (com as atividades e responsabilidades cotidianas de um pai de 3 filhos, para utilizar rotineiramente todas as possibilidades do equipamento, precisaria que o meu dia fosse igual ao de vênus - equivalente a 243 dias terrestres). Sexta-feira, após o costumeiro passeio com os  cavalos, contemplando sua força e beleza na pista empoeirada da Barra Nova, retorno com o meu primogênito ainda ouvindo seus ensinamentos cibernéticos. Com um pouco mais de informação sobre o mundo virtual e, consequentemente, menos espantado - até utilizando alguns recursos -, repentinamente no trajeto para casa me lembrei do meu pai - na minha adolescência - preocupado com o futuro dos filhos no envolvimento com as novidades da modernidade. Menos catastrófico que ele, também achei necessário refletir com o Victor sobre um dos maiores desafios comportamentais da humanidade que vislumbro para as próximas décadas:  selecionar.
      Numa sociedade que busca cada vez mais situações ou relações intensas, rápidas e cômodas,  escolher não será uma tarefa fácil. A rapidez e a variedade de opções (brinquedos, máquinas, cursos, profissões, igrejas, encontros e experiências), bem como a facilidade de obtenção, incorporadas nos relacionamentos afetivos, educação dos filhos, decisão profissional, lazer e religião tornarão as pessoas cada vez mais ansiosas quando tiverem que preferir (arrisco-me a dizer que o avanço econômico, a competitividade e a sofisticação da vida, entre outras coisas, contribuirão bastante para esta possível realidade).
      Como realizar uma escolha apressadamente, se seu processamento necessita de circuitos cerebrais amplos e distintos, com ingredientes cognitivos e emocionais, fermentados sob a ação branda do tempo e da solidão?  Como selecionar o primeiro, sem a incômoda sensação de renunciar o segundo, terceiro, quarto, quinto (não seria mais confortável tê-los também)? Como optar por algo ou alguém, tendo que enfrentar as consequentes implicações? E, finalmente, como aguardar o amadurecimento dos frutos da escolha, com tanta pressa?
      É claro que não esgotei meu filho com todos estes questionamentos (afinal de contas ele - como eu - precisamos nos deslumbrar com algumas coisas); procurei apenas estimulá-lo na reflexão de certos aspectos envolvidos na relação com amigos, paqueras, escolha profissional mas, sobretudo, procurei destacar determinadas instruções que acredito serem aplicativas no inevitável, complexo e cotidiano jogo: viver.