segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Os exageros na educação dos nossos filhos


    Hoje amanhecemos bastante apreensivos com a hospitalização de uma pessoa muito amiga da família - um adolescente que, numa dose elevada de imprudência, sofreu um traumatismo craniano. Felizmente as primeiras notícias indicam uma melhora e estamos torcendo muito para uma rápida recuperação. Mas, diante do ocorrido, de outras situações caseiras e de ter presenciado esta semana, num mercadinho do bairro, uma mãe com grandes dificuldades para administrar os desejos dos filhos na compra do lanche da escola, novamente surgiram algumas perguntas: o que estamos fazendo com os nossos filhos? Como distinguir entre o que é fundamental, interessante e  irrelevante para estimular na educação dos nossos meninos? 
      As pessoas de mais idade dizem a uma só voz que "a educação das crianças está muito mudada". Segundo eles, antigamente, menino mal falava diante dos adultos. Quase não manifestava a sua preferência e muito menos decidia alguma coisa. Cabiam aos pais tomar todas as decisões que envolviam a vida do menor, seja na alimentação, vestimenta, passeios e hábitos (estudo, sono, brincadeira, boas maneiras). De quebra, um sistema disciplinar muito presente, que incluía palmadas, surras com cinto, castigos, estudo em colégio interno, entre outros. Havia a compreensão de que uma criança era incapaz de tomar decisões e, por isso, necessitava da experiência e autoridade do adulto. Além disso, os pais transferiam sua autoridade às escolas e professores, que também mantinham um rígido controle dos alunos, podendo utilizar até castigos físicos (palmatória, ajoelhar-se no milho). Entretanto havia também importantes limitações afetivas nas relações, com uma reduzida demonstração de carinho entre os familiares.
     Não sei se influenciada pelo fortalecimento da democracia no país e pelas mudanças econômicas e sociais ocorridas nas últimas décadas, mas a realidade é que a família mudou. Antes verticalizada, as relações passaram a ser horizontais, com uma maior distribuição das necessidades, desejos, opiniões e autoridade. O temor e o distanciamento deram lugar ao companheirismo e à cumplicidade. A reciprocidade afetiva entre pais e filhos foi construída. Progressivamente a prole vem tendo uma participação cada vez maior nos acontecimentos e decisões familiares - sem falar das decisões que lhe dizem respeito! Em casa e na rua, menores estão decidindo o que e como fazer. É crescente a dificuldade dos pais em estabelecerem um cardápio cotidiano diante da recusa dos filhos em se alimentar de frutas, verduras e até carnes. O local das refeições, pelo gosto deles, tem se tornado itinerante - na sala, no quarto, na varanda - e, a  companhia mais frequente, é a televisão. O sono, embora fartamente demonstrada a sua importância no equilíbrio físico e mental, vem perdendo relevância nos lares, com as crianças dormindo muito tarde. Nas festas, eles decidem e comunicam aos pais o entretenimento a ser utilizado, a roupa que irá vestir, a maquiagem desejada e a hora de começar e terminar (sem esquecer o consumo precoce de bebidas alcoólicas pelos adolescentes que, na impotência ou concordância dos pais, potencializa a impulsividade peculiar da idade, deixando-os mais inclinados a atitudes inconsequentes e, algumas vezes, desastrosas).  Com o poder de compra que adquiriram, os pequenos são vistos pelos anunciantes da tv como um novo nicho de mercado e, nas lojas, são tratados como clientes especiais, sendo-lhes oferecida uma quantidade interminável de produtos. É um pequeno adulto.
      Se as gerações anteriores cometeram alguns exageros e conseguimos, agora, que nossas famílias tenham se tornado mais descontraídas e carinhosas, permitindo, entre outras coisas, que o pai desenvolvesse um contato  mais próximo e afetivo com o filho - antes restrito à mãe -,  parece também que estamos exagerando. Se antes havia intransigência com o comportamento pueril, hoje há permissividade, passando de uma ditadura adulta para uma infantil; se o controle era ostensivo, atualmente nos aproximamos da omissão, deixando que menores de idade tomem decisões as quais não estão preparados biológica e emocionalmente; se a valorização da autoestima não era uma prioridade no passado, passamos a estufar o ego das nossas crianças, deixando-as exageradamente vaidosas, também por não as repreender oportunamente; se algumas vezes o sofrimento era utilizado de forma desnecessária como um instrumento pedagógico, invertemos a situação e estamos ensinando a nossos filhos serem fóbicos a tudo o que os incomode e lhes cause frustração, impedindo-os de vivenciarem sofrimentos naturais da vida. O momento está exigindo reflexão de todos nós - pais, avós, tios, primos, filhos, amigos. Precisamos pensar mais, para não sermos apenas repetidores do que está acontecendo. É prudente desfrutarmos os avanços recentes sem esquecermos a experiência passada. Mas é fundamental estarmos sempre lembrados de que, ao evitarmos um incômodo necessário no presente, corremos um risco de uma dor maior no futuro.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Desenvolvimento humano

     Nesta última quarta-feira, numa passagem rápida na casa de meus pais, após alguns minutos escutando  meu idoso relatar, escandalizado, as notícias da criminalidade do jornal da cidade, fui tentar identificar o problema com o telefone celular de minha mãe, que não funcionava. Quando desmontei o aparelho e peguei o chip na mão, o patriarca - uma pessoa naturalmente avessa a equipamentos eletrônicos - comentou espantado: "mas como pode algo tão pequeno conter tantas informações?!" Depois de rápidas elucubrações e dos cumprimentos me despedi deles, mas não da perplexidade do meu pai diante da crueldade e da genialidade humana. Fui embora com a desigualdade dos comportamentos humanos ocupando meus pensamentos.
      No decorrer deste dia as informações de centenas de mortos nos conflitos sociais no Egito, a eterna guerra entre palestinos e israelenses e o atentado no Líbano, de um lado, e a descoberta de novos  medicamentos para o câncer, a tecnologia empregada na extração do petróleo do pré-sal brasileiro e o início do recrutamento de candidatos para colonizar marte, de outro, fomentaram ainda mais a minha inquietação frente a condutas humanas tão díspares. É uma intensa e progressiva habilidade em compreender e manusear o ambiente externo, contrastando com um manejo rústico e desajeitado do ambiente interno. Modificamos paisagens, transformamos o dia e a noite, prorrogamos a morte, mas pouco alteramos nossa realidade subjetiva, e continuamos ainda reféns das nossas necessidades ancestrais (protagonizadas pelo prazer e poder).
      No oriente e no ocidente várias religiões e correntes filosóficas surgiram para nos disponibilizar reflexões e opções comportamentais mais refinadas - geralmente indicando as vantagens de se renunciar alguns desejos - mas, realmente, nossas inclinações pouco mudaram nos últimos milhares de anos. Talvez por isto muitos já perderam as esperanças na humanidade, percebendo-a perversa e condenada ao fracasso. Mas, se considerarmos a evolução das espécies, quantas mudanças biológicas ocorreram ao longo de 5 ou 10.000 anos num animal complexo? Como leigo, mas curioso no assunto, acredito que nenhuma.  No pouco que li e nos documentários a que assisti só me recordo de ter identificada a expressão "milhões de anos", e não milhares. Então como podemos esperar que mudanças estruturais do comportamento humano - que também implicam em mutações genéticas - aconteçam em breves milhares de anos?  E o que dizer da nossa pretensão de testemunhar tais transformações numa piscadela de 70 ou 90 anos da nossa efêmera vida?
    O tempo que vivemos é pouco para o muito que queremos. Mas se amenizarmos a nossa ansiedade, iremos identificar no horizonte o surgimento de um novo paradigma (principalmente em países com melhor qualidade de vida). Haverá um tempo - se não houver um possível cataclismo - em que a ignorância e o preconceito que temos contra a história filogenética da humanidade darão lugar à compreensão do processo evolutivo do comportamento humano. Assim poderemos realizar nossas escolhas com serenidade e lucidez, exercendo efetivamente o livre arbítrio. Mesmo sabendo que não estarei mais aqui quando lá chegarmos, comemoro só em imaginar.

domingo, 11 de agosto de 2013

Pai nosso...

       Há várias semanas sem escrever, hoje me determinei a sentar e rabiscar qualquer coisa, nem que depois deletasse tudo. Desde o final do ano passado, por exigência de um vínculo empregatício, tenho sido obrigado a permanecer grande parte do meu tempo num setor cujas atribuições não exigem a minha presença durante todo este período. Até então, durante onze anos, pessoas que se interessaram em conhecer efetivamente as responsabilidades do serviço  - diretores, chefes, funcionários - constataram, sem muito esforço, que esta atual exigência não era essencial para a prestação de um atendimento com excelência. 
       Deixando de lado a discussão sobre as obrigações legais e a diferença entre meios e finalidade do serviço público, o que pretendo agora é apenas descrever a situação para melhor visualiza-la, tentando amenizar o persistente incômodo e facilitar uma provável decisão. Desde o último natal, a permanência num ambiente de trabalho progressivamente insalubre, com algumas relações bem desgastadas e mudanças significativas no modus operandi do setor tem sido acompanhada de uma insidiosa insatisfação, culminando num tratamento de gastrite no mês passado e crises de labirintite nos últimos dias. Não é a toa que dirigindo, conversando com familiares e amigos ou simplesmente repousando, repetidamente me percebo pensando ou falando sobre o assunto (como se não bastasse a perda desnecessária de tantas horas do meu dia, preencher também grande parte dos meus pensamentos é um desperdício da minha vida!).
       Mesmo sabendo que deveria agradecer por estar empregado, que esta pode ser apenas uma fase transitória e que o serviço público é assim mesmo, o incômodo parece progredir... Será que a segurança de um emprego justifica a constante insatisfação no ambiente profissional? O salário no final do mês, protagonizado pela assiduidade e pontualidade, compensa os gastos  com os tratamentos e o mal estar vivenciado? A garantia de uma aposentadoria na velhice ameniza a sensação de esvaziamento nos dias, meses e anos que se seguem? "Pois onde estiver o seu tesouro, aí também estará o seu coração"(Mateus 6:21).
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