domingo, 4 de novembro de 2012

Parabéns


         Na quarta-feira passada, 31 de outubro, fui comemorar com familiares os oitenta anos do meu pai. Embora eu não tenha testemunhado praticamente a metada de sua vida - quando eu nasci ele tinha 37 anos - sei que foram anos de muitas dificuldades: família de poucos recursos financeiros e muitos filhos (mais de 10), com uma mãe especializada nos cuidados maternos e um pai muito habilidoso nos números e nas palavras - orgulhosamente, foi um dos pioneiros no jornalismo alagoano -, mas que precisava trabalhar os três horários para sustentar a casa. Sendo o mais velho dos homens, a responsabilidade com as necessidades do lar foram precocemente assumidas pelo meu velho, que transbordava de disposição e compromisso familiar. Num ambiente com fartura de informações, entusiasmou-se progressivamente pelas leituras diversas, culminando nas graduações de Filosofia e Direito. Nos últimos quarenta anos os desafios e obstáculos continuaram, com significativas perdas (emocionais) e alguns ganhos, mas ele sempre enfrentando com um imenso senso de honestidade e responsabilidade - suas principais características. Sem falar da admirável e inquietante inclinação pelas coisas simples e naturais, e do desapego a ideologias e modismos.
         Tirando as peculiaridades e outras limitações pessoais, a história de meu pai é semelhante à de muitos pacientes idosos por mim atendidos: um início de vida com muitas restrições, em famílias numerosas e geralmente pobres, longos momentos de sofrimento, participação precoce nos serviços de casa, forte espírito de coletividade entre os familiares, a honestidade como vaidade e o sucesso obtido de forma lenta e gradual. Entretanto, num outro grupo de pacientes, tenho escutado o relato de experiências familiares bem diferentes: lares com poucas crianças, com a geladeira e armários abarrotados de alimentos, parentes e funcionários geralmente tentanto satisfazer imediatamente a maioria dos desejos dos menores, um esforço acentuado para manter o filho alegre e impedir o seu sofrimento, pouca (ou nenhuma) colaboração das crianças e adolescentes nas atividades caseiras, a colocação da inteligência e da competitividade como objetivos maiores na formação da prole, e o ato de comprar adquirindo status de principal fonte de prazer.
        Pelo que percebo - e dizem os especialistas - as significativas mudanças econômicas ocorridas nas últimas décadas no país vêm, gradativamente, modificando o nosso comportamento. Embutidos nos novos produtos e serviços, estão os recentes valores sociais: a intensidade, a velocidade e a comodidade. Na relação com as pessoas, objetos e acontecimentos, temos sido influenciados a considerar como positivas as vivências intensas, rápidas e cômodas. Mas, qual o verdadeiro impacto destas modificações no nosso comportamento? Quais habilidades e dificuldades serão fortalecidas? A que tipo de distúrbios ou transtornos estaremos vulneráveis com tais alterações? Contribuirão para favorecer a serenidade e sabedoria, ou a ansiedade e a angústia? Com todos os exgeros e equívocos, parabéns a você meu pai, e a sua geração!
 

     

Nenhum comentário:

Postar um comentário