Na quarta-feira passada,
31 de outubro, fui comemorar com familiares os oitenta anos do meu pai.
Embora eu não tenha testemunhado praticamente a metada de sua vida - quando eu
nasci ele tinha 37 anos - sei que foram anos de muitas dificuldades: família de
poucos recursos financeiros e muitos filhos (mais de 10), com uma mãe
especializada nos cuidados maternos e um pai muito habilidoso nos números e nas
palavras - orgulhosamente, foi um dos pioneiros no jornalismo alagoano -, mas
que precisava trabalhar os três horários para sustentar a casa. Sendo o mais
velho dos homens, a responsabilidade com as necessidades do lar foram
precocemente assumidas pelo meu velho, que transbordava de disposição e
compromisso familiar. Num ambiente com fartura de informações, entusiasmou-se
progressivamente pelas leituras diversas, culminando nas graduações de Filosofia
e Direito. Nos últimos quarenta anos os desafios e obstáculos continuaram, com
significativas perdas (emocionais) e alguns ganhos, mas ele sempre enfrentando
com um imenso senso de honestidade e responsabilidade - suas principais
características. Sem falar da admirável e inquietante inclinação pelas coisas
simples e naturais, e do desapego a ideologias e modismos.
Tirando as peculiaridades e outras
limitações pessoais, a história de meu pai é semelhante à de muitos pacientes
idosos por mim atendidos: um início de vida com muitas restrições, em famílias
numerosas e geralmente pobres, longos momentos
de sofrimento, participação precoce nos serviços de casa, forte espírito de
coletividade entre os familiares, a honestidade como vaidade e o sucesso obtido
de forma lenta e gradual. Entretanto, num outro grupo de pacientes, tenho
escutado o relato de experiências familiares bem diferentes: lares com poucas
crianças, com a geladeira e armários abarrotados de alimentos, parentes e
funcionários geralmente tentanto satisfazer imediatamente a maioria dos desejos
dos menores, um esforço acentuado para manter o filho alegre e impedir o seu
sofrimento, pouca (ou nenhuma) colaboração das crianças e adolescentes
nas atividades caseiras, a colocação da inteligência e da competitividade como
objetivos maiores na formação da prole, e o ato de comprar adquirindo status de
principal fonte de prazer.
Pelo que percebo - e dizem
os especialistas - as significativas mudanças econômicas ocorridas nas últimas
décadas no país vêm, gradativamente, modificando o nosso comportamento.
Embutidos nos novos produtos e serviços, estão os recentes valores sociais: a
intensidade, a velocidade e a comodidade. Na relação com as pessoas, objetos e
acontecimentos, temos sido influenciados a considerar como positivas as
vivências intensas, rápidas e cômodas. Mas, qual o verdadeiro impacto destas
modificações no nosso comportamento? Quais habilidades e dificuldades serão
fortalecidas? A que tipo de distúrbios ou transtornos estaremos vulneráveis com
tais alterações? Contribuirão para favorecer a serenidade e sabedoria, ou a
ansiedade e a angústia? Com todos os exgeros e equívocos, parabéns a você meu
pai, e a sua geração!
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