domingo, 22 de abril de 2012

Diferenças que fazem a diferença

       No início de uma avaliação neuropsicológica com crianças menores de seis anos, após entrevista inicial com os pais, geralmente vou à escola - com a autorização deles e da instituição - para observar o estudante no contexto escolar: converso com a equipe técnica e acompanho algumas atividades na sala e/ou no recreio, sem que o mesmo saiba quem sou (para que minha presença tenha menor impacto no seu comportamento espontâneo). Com este objetivo fui, nesta última sexta-feira, avaliar dois estudantes numa mesma escola. Após o contato inicial com a coordenadora, que me forneceu algumas informações preliminares, foi chamada a professora para detalhar as dificuldades identificadas no garoto. Em seguida fui para a sala de aula observá-lo na relação com a professora, com os colegas e com a aprendizagem. Diferentemente das situações anteriores - com outros pacientes -, onde geralmente presencio a inquietação, irritabilidade, agressividade, coordenação motora incipiente ou dificuldade de seguir normas e regras, neste dia houve uma peculiaridade: a grande semelhança comportamental dos menores, apresentada pela equipe pedagógica e demonstrada por eles durante a visita. Como num déjà vu, nos dois procedimentos as professoras relataram basicamente as mesmas queixas, percebidas in loco: intensa dificuldade de relacionamento, isolamento social, movimentação constante e aparentemente despropositada na sala de aula, linguagem e comunicação restritas, incômodo acentuado diante do barulho, indiferença pelas atividades escolares, evitação do contato visual e um grande interesse em permanecer diante do espelho, realizando alguns movimentos estereotipados com as mãos. Apesar das outras características individuais distintas - um costuma jogar-se embaixo da carteira quando inseguro e o outro manifesta um importante espelhamento quando presencia um colega chorando -, a repetição das mesmas dificuldades foi o diferente no último dia útil desta semana, no contato com dois pacientes com perfil sugestivo do espectro autista. Nas escolas por onde tenho andado, diferente é também como são definidas estas e outras pessoas que apresentam  Transtorno Invasivo do Desenvolvimento; pouco habilidosas na compreensão dos jogos sociais e na reciprocidade, aparentando descaso com o outro. E para complicar a situação delas, as restrições que apresentam não se resumem à socialização, mas comprometem ainda a comunicabilidade e o repertório de interesses. Independente da possibilidade da preservação, em determinados pacientes, de várias funções cognitivas - inteligência, memória declarativa, funções visuoespaciais -, até com desempenho diferenciado em alguma delas, a tríade limitação (linguagem, socialização e comportamentos) causa realmente um transtorno na vida da criança e da família; resultam numa intensa desvantagem em relação aos demais alunos da turma. Entre outros, com estimulação fonoaudiológica, psicopedagógica e afetiva é possível atenuar os sintomas. No momento, entretanto, o que preciso tentar diminuir é a dificuldade das famílias daqueles garotos - percebida no primeira entrevista - em aceitar a hipótese diagnóstica do espectro autista. Isto sim fará toda a diferença!

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