domingo, 6 de maio de 2012

Animais

      O desenvolvimento urbano de uma região geralmente resulta num desequilíbrio ambiental, comprometendo as espécies animais e vegetais, porém com a permanência de alguns exemplares mais adaptáveis. Lá na Barra Nova a destruição da capoeira pela expansão imobiliária vem destruindo o habitat de mamíferos, aves e répteis, além da vegetação nativa. Porém, alguns pássaros e mamíferos continuam no território, resistindo bravamente à invasão humana. Um deles é um inquilino ágil e travesso, que se move pela fiação elétrica e antenas de tv das casas, pula muros e telhados, procurando os pés de caju, manga e goiaba das residências: o sagui. Hoje, quando voltei ao povoado, na expectativa de encontrar frutas bem madurinhas em casa, mais uma vez cheguei tarde: os pequenos macacos já tinham feito a festa e só encontrei o resto no chão. Enquanto apanhava as sobras da farra da macacada, escutei os guinchos e assobios emitidos de longe; em seguida, mais próximos, presenciei uma briga barulhenta entre dois machos, provavelmente por ascensão social ou competindo por uma fêmea (dizem que o sagui demonstra sua superioridade na hierarquia mostrando seu traseiro ao outro). Entre residências e automóveis, o primata sobrevive e mantém seus antigos hábitos. É o convívio do primitivo com o novo, do rudimentar com o civilizado.
         Um pouco frustrado por não fazer a colheita desejada, não demorei muito e fui almoçar com  familiares. No final da tarde, regressando para Maceió, encontrei os rotineiros malabaristas no semáforo, tentando descolar um trocado. Um pouco mais a frente, numa marquise de uma grande loja, um amontoado de adolescentes me chamou a atenção: maltrapilhos e com uma aparência pré-histórica, eles se envolviam numa briga feroz. Uma mão segurando um garrafa de plástico com cola de sapateiro e a outra com uma grande pedra, dois garotos se ameaçavam intensamente. A agressividade estampada nos olhos e corpos imundos, o jeito como se movimentavam e a excitação do grupo para ver quem seria o mais forte foi algo chocante! Uma bizarra situação que parecia mais uma cena de documentário do History sobre  civilizações primitivas. Só que estava acontecendo no século vinte e um e eu estava presenciando. Estava testemunhando pessoas - como eu e meus filhos - vivendo e se comportando como animais selvagens; usando substâncias psicoativas, que causam danos até irreversíveis nos circuitos cerebrais responsáveis pela aprendizagem e pelo controle dos impulsos; eu estava assistindo à ausência total do Estado e o resultado de décadas de irresponsabilidade e desumanidade dos nossos representantes e gestores públicos (referendados pela nossa conveniente conivência), numa disputa eterna para ser o macho alfa.
        Gostaria muito de poder continuar presenciando cenas de comportamento selvagem apenas nos saguis e não em pessoas, que as disputas ficassem nos estádios e quadras esportivas, que a urbanidade predominasse no ambiente urbano, e que pudéssemos ser mais eficientes em identificar nuances de condutas animalescas, extinguindo-as civilizada e democraticamente.

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