domingo, 1 de dezembro de 2013

Perdas e ganhos

   
     Pesquisas sobre a participação de áreas cerebrais na experiências religiosa foram apresentadas em uma das palestras do XII Congresso Brasileiro de Neuropsicologia, que aconteceu em São Paulo há 10 dias. Denominada neuroteologia, parece que busca analisar, através do método científico, um dos comportamentos mais característicos do ser humano: a fé. Na expectativa de um evento exclusivamente sobre transtornos e disfunções cerebrais, fiquei realmente surpreso com a tentativa de aproximar visões que, desde pequeno, escuto que são antagônicas: ciência e religião. De acordo com o palestrante, apesar dos estudos de neuroimagem funcional de estados contemplativos indicarem alterações em regiões corticais (temporal, parietal e frontal), isto necessariamente não invalida a hipótese da existência de algo que transcenda a existência humana.
     Na viagem de volta, folheando os papeis do congresso e relembrando determinados comentários sobre síndromes demenciais e os transtornos de aprendizagem, o assunto Deus X cérebro várias vezes ocupou meus pensamentos. Ao chegar no aeroporto de Maceió, após quase três horas de viagem, esperando as bagagens na esteira, recebi uma ligação aflita do funcionário, dizendo que há três dias vinha tentando se comunicar comigo para avisar que o Luke estava muito doente, sem querer comer e que precisava ir ao veterinário com urgência. No trajeto para casa, a alegria de voltar e rever os filhos foi alterada pela preocupação com a saúde do nosso cachorro. Comentando com Adriana sobre algumas características marcantes deste animal, destaquei o fato de, embora sua raça não seja considerada cão de guarda (cocker spaniel),  tenho me sentido bem mais seguro com a sua presença na nossa casa da Barra Nova (não fomos mais furtados após a sua chegada, há sete anos). Ao deixarmos as malas e revermos os meninos, fomos socorrer o animal. Quando lá chegamos e abrimos o portão já não fomos recebidos com a costumeira e desajeitada alegria do Luke, vendo apenas o seu filho e companheiro Veludo. Procuramos e chamamos  pelo seu nome algumas vezes até que o encontramos deitado na garagem, mas vivo. Não conseguia levantar-se. Comecei a falar com ele e  acariciá-lo, junto com os meninos, e percebi sua respiração ficar mais ofegante. Rapidamente coloquei nos braços e seguir em direção ao carro para levá-lo ao veterinário, quando ele se esticou e deu o último suspiro.  Morreu diante de todos nós, exatamente cinco minutos após nossa chegada. Passado algum tempo e bastante entristecidos, envolvemos o Luke num lençol, colocamos umas flores sobre ele e o enterramos no quintal de casa. 
      Por que ele morreu? Para onde ele foi agora? O que acontece quando morremos? Cachorro vai para o céu? Eu não quero morrer! Estes foram alguns dos questionamentos e comentários que ouvi enquanto dirigia para Maceió, mas não tive muito o que responder. Silenciosamente, choramos juntos. Como em outras situações já vivenciadas de perda de familiares e amigos, não há como não se inquietar com a violenta interrupção da convivência de um ente querido. Sem falar das explicações nem sempre adequadas que são disponibilizadas. Por isso é essencial que a neuroteologia - ou qualquer outro ramo do conhecimento - venha verdadeiramente contribuir para a comunhão da curiosidade e destemor do pensamento científico com a paz e humildade da vivência religiosa. Porém, percebo que até lá, religião e ciência, enquanto instituições que estabelecem regras e normas, devem ser consideradas com moderação.

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